Contratar prestadores de serviços é uma prática comum em muitas empresas, mas é importante estar ciente dos riscos envolvidos, especialmente o reconhecimento do vínculo empregatício, que pode trazer grande prejuízos para a empresa.
1. O que é o vínculo empregatício?
Antes de discutir os riscos envolvidos na contratação de prestadores de serviços, é importante entender o que é o vínculo empregatício. Conforme prevê o art. 3o da CLT, o vínculo empregatício é a relação de trabalho que se desenvolve com habitualidade, onerosidade, pessoalidade e subordinação:
Habitualidade: O trabalho deve ser realizado de forma regular e constante.
Onerosidade: O empregado deve receber uma remuneração em troca do trabalho realizado.
Pessoalidade: O trabalho deve ser realizado pelo próprio empregado, e não por outra pessoa que ele possa subcontratar para substituí-lo.
Subordinação: O empregado deve estar sob a supervisão e direção do empregador, seguindo suas ordens e instruções na execução de suas tarefas.
"Art. 3º, CLT - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. ".
2. O que é um prestador de serviços?
Por consequência lógica, o prestador de serviços é aquela pessoa ou empresa que presta determinado serviço sem a presença de um ou mais elementos configuradores do vinculo empregatício. Mas, em se tratando de profissionais autônomos, na prática - muitas vezes - há uma linha bastante tênue na distinção entre um prestador e um empregado, haja vista que a habitualidade, a pessoalidade e a onerosidade costumam estar presentes na maioria das prestações de serviços realizadas por profissionais autônomos, restando assim, analisar a existência ou não da subordinação. E é ai que tudo se torna mais complexo, pois a subordinação é subjetiva e pode se desenvolver de algumas formas.
De qualquer modo, para simplificarmos e não precisarmos entrar aqui em longas explanações jurídicas, em linhas gerais, é importante entender que o prestador de serviços deve ser responsável por suas próprias obrigações e métodos utilizados no seu dia a dia para atingir o objetivo do serviço contratado, agindo como "chefe de si mesmo", além é claro de responder direta e exclusivamente pelos encargos de sua atividade, sejam elas despesas ou obrigações legais e fiscais, assumindo assim os riscos de sua atividade.
3. Os riscos de reconhecimento do vínculo empregatício
Como vimos, o reconhecimento do vínculo empregatício do profissional autônomo pode ocorrer quando a prestação de serviços é realizada com habitualidade, onerosidade, pessoalidade e, principalmente, sob subordinação da empresa contratante.
Nesse caso, a Justiça do Trabalho pode entender que existe um vínculo empregatício entre o prestador de serviços e a empresa contratante, mesmo que tenha sido formalizado um contrato de prestação de serviços e o autônomo tenha emitido notas fiscais, pois no direito do trabalho o que vale é como a relação se estabeleceu na prática e não no papel - é o que a doutrina conceitua como "princípio da verdade real", que vigora no direito do trabalho.
Claro que, a empresa contratante sempre deve formalizar a atuação do profissional autônomo da forma correta e mais completa possível - seguindo todas as determinações legais - para que assim, se o vinculo empregatício for questionado na justiça, ao menos exista prova documental suficiente para sustentar a contratação autônoma de caráter civil. Isso ajudará bastante em uma eventual ação trabalhista, especialmente porque quando a empresa contratante reconhece a prestação do serviço em sua defesa - o que normalmente é inevitável -, acaba atraindo para si o ônus da prova da inexistência do vínculo empregatício. Neste sentido, colhe-se da jurisprudência do TST:
AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. VÍNCULO DE EMPREGO. ÔNUS DA PROVA. O Tribunal de origem consignou que a reclamada atraiu para si o ônus da prova ao alegar que o reclamante exercia seu trabalho de forma autônoma, o que está de acordo com o entendimento adotado nesta Corte Superior. Com efeito, quando o empregador admite a prestação de serviços, negando, contudo, o vínculo empregatício, atrai para si o ônus da prova de que aquela ostenta natureza jurídica diversa da trabalhista, fato impeditivo do direito vindicado. Destarte, o conhecimento do apelo esbarra no óbice previsto no artigo 896, § 7º, da CLT e Súmula nº 333 do TST. Agravo conhecido e desprovido. (TST - Ag: 10009060420195020041, Relator: Alexandre De Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 05/11/2021, 3ª Turma, Data de Publicação: 12/11/2021)
4. Como evitar o reconhecimento do vínculo empregatício?
Considerando a soberania da realidade fática no direito do trabalho, acima mencionada, é de suma importância que, durante o desenvolvimento dos serviços prestados pelo profissional autônomo, a empresa tome cuidado para não agir como se tivesse contratado um empregado, ultrapassando limites de interferência na execução das atividades do prestador que caracterizem a subordinação, pois isso poderá caracterizar o vínculo empregatício.
Em termos práticos, é fundamental que a empresa dê liberdade para que o autônomo conduza o trabalho sem subordinação, ou seja, sem dar ordens que interferiram constante e diretamente na rotina de trabalho do prestador, aplicar advertências, determinar horários, fornecer equipamentos, impor normas internas da empresa de cunho celetista e etc.
Alguns cuidados que devem ser tomados incluem:
Formalizar um Contrato de Prestação de Serviços específico e bem definido;
Garantir que o prestador de serviços tenha autonomia na execução dos serviços contratados;
Evitar a subordinação do prestador de serviços à empresa contratante;
Garantir que o prestador de serviços tenha seus próprios equipamentos e materiais para a execução dos serviços contratados;
Evitar nomear o prestador de serviços como ocupante de um cargo da empresa que remeta à sua estrutura hierárquica (ex: gerente, coordenador, auxiliar, etc);
Pagar pelos serviços prestados por produtividade/entrega do serviço, sem que haja pagamento de salário mensal.
Evitar que o prestador use uniforme, cartão de visitas e/ou email corporativo da empresa;
Afinal, uma vez reconhecido o vínculo empregatício, a empresa será condenada a pagar ao prestador - agora empregado -, de forma retroativa, todas verbas trabalhistas previstas na CLT, tais como: férias, décimo terceiro, horas extras, aviso prévio, FGTS, multa rescisória de 40% do FGTS, direitos normativos (sindicais) previstos em Convenções Coletivas da Categoria, adicionais eventualmente devidos, estabilidades; enfim, tudo o que um empregado possa eventualmente requerer em uma ação trabalhista conforme o caso concreto, além - é claro - das obrigações previdenciárias e fiscais. O que pode e costuma alcançar valores bastante elevados.
5. Conclusão
Com base em tudo o que discutimos neste artigo, fica evidente que o reconhecimento do vínculo empregatício na contratação de prestadores de serviços autônomos pode ser um processo complexo e repleto de riscos para as empresas, com consequências jurídicas e financeiras bastante significativas, o que reforça a necessidade de adotar medidas preventivas para evitar problemas.
Para tanto, as empresas devem estar atentas às características e particularidades de cada prestador de serviços autônomo contratado, firmando contratos precisos que contemplem todas as obrigações e responsabilidades de cada parte envolvida, a fim de evitar possíveis interpretações equivocadas.
Em suma, a contratação de prestadores de serviços pode ser uma excelente estratégia para empresas que desejam otimizar seus recursos e maximizar seus resultados. No entanto, é fundamental que essa prática seja realizada com responsabilidade, transparência e atenção aos riscos envolvidos.
Por fim, recomendamos que as empresas busquem o auxílio de advogados especializados em direito trabalhista empresarial, para que possam realizar uma análise adequada de suas operações e minimizar os riscos de reconhecimento de vínculo empregatício.
por André Guidi
Advogado especializado em Direito do Trabalho Empresarial
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